Autor: Caio Joppert
A crescente preocupação com o meio ambiente tem trazido à tona discussões sobre combustíveis alternativos, descarbonização da matriz energética e ESG (Environmental, Social and Governance ). Dentre as várias possibilidades de combustíveis limpos e alternativos, o biogás tem ganhado destaque no noticiário após a inauguração de uma planta de geração de 21 MW usando vinhaça de uma usina de açúcar e álcool no interior de São Paulo (https://www.canalenergia.com.br/noticias/53151138/raizen-inaugura-usina-de-21-mw-a-partir-de-biogas). Mas o que é o biogás e o biometano, muitas vezes chamado de gás natural verde ou gás natural renovável? Neste post, a FIGENER explica um pouco sobre o que é o biogás e o biometano e as tecnologias envolvidas na produção deste combustível renovável.
O QUE É BIOGÁS E BIOMETANO?
A figura abaixo mostra as definições da ANP (Agência nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) para o biogás e biometano. O que diferencia o processo do biogás do da compostagem é a presença de oxigênio: o biogás só é gerado na total ausência desta substância
A exata composição do biogás é altamente dependente da fonte de matéria orgânica, com os contaminantes que vêm do processo biológico variando em tipo e quantidade. Os principais contaminantes são mostrados no esquema a seguir. Eles devem ser removidos física ou química ou biologicamente para obter o biometano.
COMO O BIOGÁS E BIOMETANO SÃO PRODUZIDOS?
O biogás pode ser produzido em escala pequena até industrial. Já o biometano necessita de equipamentos industriais para ser produzido. A figura a seguir mostra um fluxograma esquemático da produção do biogás e biometano, da fonte até o uso final. Enquanto o biogás pode ser usado para gerar calor e energia elétrica, o biometano pode ter fins mais nobres, como substituir gás natural, GLP, ou ser usado em motores de veículos automotivos.
O tratamento da matéria orgânica pode ocorrer de diversas formas, e em diversas fases. As mais comumente aplicadas são: recolhimento de gás de aterro sanitário, uso de lagoas anaeróbicas de estabilização e uso de biorreatores. Tecnologias de digestão mais atuais envolvem o uso de lagoas com recirculação e mistura de diferentes matérias orgânicas para aumentar a produção de gás além do que se obteria pela soma dos processos de digestão separados (co-digestão). A figura a seguir mostra, resumidamente, as principais tecnologias e suas características.
POSSO USAR O BIOGÁS SAÍDO DIRETO DO REATOR, ATERRO OU LAGOA?
O biogás não deve ser usado para qualquer fim sem tratamento prévio, para garantir sua segurança e adequação às normas vigentes. Para que o biogás possa ser usado, ele deve passar por um processo chamado de limpeza, onde processos físicos, químicos ou até biológicos vão remover os contaminantes-traço e umidade. O biogás limpo já pode ser usado para geração de energia elétrica e/ou calor usando motores a gás ou microturbinas a gás. No entanto, para que possa ser chamado de biometano e ser usado, por exemplo, como um gás substituto de gás natural ou GLP, o biogás limpo deve passar por mais uma etapa, chamada de upgrading ou beneficiamento, onde é removido o dióxido de carbono (CO2). Por fim, pode ser necessário um condicionamento final do biometano em função do uso final. O esquema de rotas tecnológicas mostradas a seguir deixa claros os muitos caminhos que podem ser seguidos
As tecnologias para limpeza e upgrading de biogás não são novas: já se usam os processos há muitos anos para promover a limpeza e condicionamento do gás natural retirado de poços de petróleo. Assim, com várias tecnologias possíveis, há diversas rotas que podem ser usadas, a depender da fonte de matéria orgânica e dos contaminantes presentes no biogás. Muitas vezes, tecnologias de limpeza e upgrading podem, inclusive, se sobrepor. A correta escolha da rota de limpeza e upgrading deve ser estabelecida por engenheiros qualificados e experientes, pois uma ordem incorreta de operações pode comprometer todo o processo.
NÃO É RUIM QUE O PROCESSO DE UPGRADING GERA CO2, QUE É UM GÁS DE EFEITO ESTUFA?
Não, pois o carbono presente no CO2 (e no metano) não aumenta o efeito estufa: o carbono estava na matéria orgânica, vai para a atmosfera e será fixado em matéria orgânica (vegetação) novamente. É diferente de colocar na atmosfera o carbono de CO2 ou metano que estava “guardado” em reservas geológicas, adicionando carbono mais rapidamente do que os ecossistemas conseguem capturar. Ainda, o processo biológico controlado e em escala industrial impede que o metano, que é 25 vezes pior que o CO2 em termos de efeito estufa, seja emitido de maneira descontrolada para a atmosfera. Por esse motivo, o biogás e biometano são biocombustíveis limpos e de grande interesse na lógica ambiental e de ESG que se discute atualmente. Pesquisas de ponta, atualmente, discutem a captura, uso ou estocagem do CO2 gerado de maneira controlada no processo de upgrading para gerar emissões virtualmente “negativas” de carbono (o chamado BECCS).
Nas próximas semanas, falaremos mais sobre o biogás e biometano, observando outros aspectos como regulação, incentivos e oportunidades. Não percam!